Um comprador foi representado na compra por um procurador que antes da escritura visitou a casa e verificou que uma das salas com marquise envidraçada apresentava humidade próxima das janelas. O vendedor justificou-se com obras levadas a cabo por um vizinho que tinham provocado danos numa janela, por onde tinha entrado água na marquise e assegurou que o vizinho havia reconhecido a responsabilidade pelo sucedido e que as reparações na janela tinham sido efectuadas.
Após a escritura surgiram novamente infiltrações e danos no pavimento da marquise tendo uma vistoria concluído que as infiltrações estavam relacionadas com uma impermeabilização inadequada da marquise. O comprador pediu ao vendedor que procedesse à reparação dos defeitos e assumisse os danos, o que este se recusou a fazer.
O tribunal considerou que se o comprador aceita a entrega do bem com um defeito, não deverá poder depois vir invocar que lhe foi entregue um bem defeituoso atento o princípio da boa-fé. Contudo, o comprador só não pode invocar o defeito se o conhecia esclarecidamente, ou seja, se conhecia o defeito na sua plenitude e não só em parte da sua extensão ou das suas consequências. O que se visa evitar é que o comprador esclarecido possa depois atuar contrariamente àquela que tinha manifestado, mas em que os pressupostos se mantêm. Por exemplo, se o comprador reconhece que o telhado tem falta de telhas por onde entra água e aceita essa situação, não pode vir depois pedir a responsabilização do vendedor por faltarem as mesmas telhas e por entrar água nesse local, sob pena de violar a confiança que o comprador tinha incutido no vendedor e que até teria determinado que procedesse à venda para depois, injustificadamente, quebrar essa confiança, alterando a sua posição. Mas se se descobrir que afinal há outras telhas que faltam que, por não se encontrarem em local visível, o comprador não podia ver e por aí também entrar água, este não está impedido de invocar o defeito por esta última situação. Quanto a esta, o comprador não era um comprador esclarecido nem se tinha pronunciado sobre tal vicissitude. Ou então, o comprador visiona que pode haver uma situação menos regular e, por não detetar, a olho nu, a causa dessa situação e por lhe ter sido dada uma explicação que poderá ter um mínimo de cabimento, acaba por aceitar que não há defeito mas depois, mais tarde, e após a compra, vem a descortinar qual o alcance do que sucede e qual o defeito. Neste caso, seja porque o comprador acaba por não ver o defeito (mas eventualmente apenas uma parte da sua consequência) e porque lhe foi dada uma explicação que se vem a comprovar não ser correta, não se está perante um defeito aparente que foi visto (ou podia sê-lo) pelo comprador.
No caso em apreciação antes da escritura havia sinais de entrada de humidade no local: perto da janela, piso com água, cheiro a humidade, infiltrações nas paredes e, por outro, pelo menos uma explicação da Ré vendedora (vizinho que tinha partido janela por onde entrou água). Ora, se é certo que os sinais são potencialmente reveladores de que há um problema com a zona em causa relativamente a infiltração de água/humidade, também é certo que, por um lado, esses sinais não são totalmente excludentes das explicações dadas pelo vendedor e, por outro, desconhece-se a real extensão da infiltração de água. Não se sabe quanta água estava infiltrada porque estaria escondida debaixo do piso e atrás da pedra que revestia a parede. Quando o procurador do comprador suscitou dúvidas, o vendedor tinha de esclarecer a situação e fê-lo, apresentando uma justificação. E, eventualmente para um comprador menos experiente, ela pode ser convincente: entrou água porque uma janela se partiu e foi-se acumulando, acrescendo que se menciona que o vizinho responsável por essa situação teria assumido a reparação. Aceitando o comprador essa explicação, tal não significa que tenha aceite um defeito de modo esclarecido pois, desde logo, o mesmo não é aparente na sua totalidade já que seria necessário indagar se a água entrava por algum outro local, mormente pelo exterior ou pelo interior, escorrendo pelas janelas, direta ou indiretamente, caindo para o piso. O que o comprador (através do seu procurador) sabia era que existiam vestígios de água e cheiro a humidade, mas não podia saber o que se passava atrás da pedra ornamental ou pelo exterior, sendo necessário a remoção e/ou análise desses locais. Por outro lado, a explicação do vendedor, podendo ser verdadeira, vem a verificar-se não o ser e não sendo verdadeira acaba por se ter uma situação em que o comprador de um imóvel o adquire, visionando apenas parte do problema, e com uma explicação não comprovada dada pelo vendedor, o que não pode, na opinião do Tribunal, significar que se está perante um reconhecimento esclarecido de um defeito que já não poderá ser posteriormente invocado.
Conclui assim o Tribunal que se está perante um defeito oculto e que o vendedor é obrigado a reparar os defeitos verificados e a pagar uma indemnização ao comprador pelos danos sofridos.